segunda-feira, fevereiro 13, 2006


O que eu não compreendo muito bem. No ano passado chegaram a minha casa uns primos vindos do Brasil, que eu nunca tinha visto e de quem raramente ouvia falar. Estiveram comigo uns dois ou três dias e seguiram para o norte. Não voltei a vê-los, nem penso neles. E acho que ninguém me pode obrigar a gostar deles só pelo facto de serem da minha família. Não posso gostar de pessoas que não conheço, e de quem nada sei. Mas posso gostar muito de pessoas que não são meus primos, nem tios, nem avós. De pessoas "que não me são nada", como costuma dizer a tia Magda para me arreliar. Então a Rita, por exemplo, não é nada para mim? Se eu não posso estar um dia sem a ver, sem brincar com ela, sem conversar com ela - isto não é importante? Por isso eu digo que se escolhesse a minha família havia de lá pôr também a Rita.
E as flores. As que me fazem companhia de gente, nunca os antúrios e as estrelícias.
E o Zarolho, que nada no aquário da entrada.
E a Zica, já só com um braço, um olho muito claro na cara preta, uma carapinha roída das traças, mas ainda a boneca preferida.
E a árvore da minha rua, com o rouxinol que todas as primaveras nela mora, e canta, e me faz contente nem sei porquê.
E a vizinha do prédio em frente, o dia inteiro agarrada à máquina de costura.
E o meu quarto e tudo o que dentro dele me pertence de verdade.
E também os livros. E os patins. E as minhas cadernetas de cromos coloridos.
Neste momento ainda não sei se a minha irmã que nasceu há quatro dias vai pertencer à minha família.
MARIANA

Alice Vieira, Rosa Minha Irmã Rosa

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