"Nunca consegui encontrar o campo de travagem da tristeza. Morri muito para não morrer. Na tristeza encontro ainda o bafo reconfortante da vida. Já não sei o que é ter frio, nem calor, nem dor - mas permaneço triste, por isso existo. Preciso de trabalhar as tintas das minhas mortais tristezas para atingir uma melancolia abstracta. Preciso que essa abstracção te preencha os poros - preciso de te habitar, de te moldar, barroco coração cubista. A tristeza impede-me de acabar de morrer - toma, douta, ajusta ao teu sangue o pudor impudico do que fui. Que te lembres dos meus contornos claros, não chega - toma o lixo infantil que não te dei, as lágrimas manchadas pelas dedadas do meu coração de chocolate. Come-as, deixa-me morrer dentro de ti - deixa-me escolher morrer dentro de ti, porque só essa morte me falta."
Inês Pedrosa in Fazes-me Falta
Inês Pedrosa in Fazes-me Falta
Sem comentários:
Enviar um comentário