
Na casa onde Ana morava, nunca batia o sol. Defronte, porém, os vidros das janelas espelhavam a luz do entardecer. Ana gozava sempre com surpresa esta pequena maravilha. Gostava de imaginar tudo o que estava ausente: as árvores, o sol, o mar, os campos. Às vezes sonhava com as coisas que mais amava. E, no dia seguinte, ficava a lembrar os sonhos como quem separa e saboreia os gomos de uma laranja doce e sumarenta...
...E por isso lhe ralhavam: porque ela era estranha e distante - e não parecia alegrar-se muito com as brincadeiras próprias da sua idade!
A escola não era distante de casa. Chegava-se lá por caminhos tortuosos e vielas. Era um velho edifício encardido e frio, entranhado de sombra e humidade. Ana não gostava daquela escola. Os melhores momentos do dia eram os do regresso a casa, pelo caminho mais longo: o do mirante, de onde contemplava o rio, cobra de prata que, sinuosa, se perdia nos longes do horizonte. Ana aprendera a defender-se do que a entrestecia e a escapulir-se da realidade baça dos dias. Refugiava-se no sonho, que acabava por ser a sua realidade...
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